Páginas

domingo, 14 de janeiro de 2007

Uma reflexão necessária

Entrei para o mundo da política em 1978, depois de anos de militância em movimentos da Igreja Católica. Minha formação teve uma forte presença da Teologia da Libertação, que na época tinha uma grande influência nas periferias dos grandes centros urbanos.

A igreja progressista incentivava seus fiéis a participarem de movimentos reivindicatórios nos bairros, bem como o engajamento nas lutas sindicais. Nos movimentos populares de bairros, organizando a luta por melhores condições de moradia, estavam presentes as pastorais sociais e as comunidades eclesiais de base; já no movimento sindical, os cristãos católicos estavam presentes através da Pastoral Operária.

A imensa maioria daqueles que participaram dessas experiências concluiram que a política era um instrumento importante para quem desejava mudanças substanciais para o nosso país. Fazer política, para minha geração, era uma espécie de missão, o caminho mais curto para alcançarmos a tão sonhoda igualdade e fraternidade para homens e mulheres.

Como muitos, optei pelo Partido dos Trabalhadores, que era a expressão de anos de luta sociais, de diversos setores da esquerda em nosso país. A nosso ver, esse partido nascia rompendo com uma série de vícios - tanto da direita quanto da esquerda tradicional. Em relação à direita, nossa divergência era mais profunda, pois nosso desejo é a superação do capitalismo; vemos neste modelo econõmico os motivos das desigualdades sociais.

Divergíamos também da velha esquerda tradicional, eramos críticos das diversas experiências socialistas. Os modelos apresentados ao mundo sob a liderança da União Soviética, onde o Leste Europeu era o principal expoente, não correspodiam à nossa expectativa. Não concordávamos com o modelo de economia planificada, concentrada nas mãos de uma burocracia estatal, com um conceito de liberdade onde o indivíduo estava à mercê dos interesses estatais e não havia espaço para qualquer tipo de privacidade. Reconhecíamos os avanços sociais obtidos nesses países nas áreas da saúde, educação etc, mas nada que pudesse justificar os demais erros.

Para nós, o PT era a possibilidade de projetarmos algo novo, capaz de superar as desigualdades sociais próprias do sistema capitalista, corrigir os erros das diversas experiências socialistas e projetar um novo caminho para humanidade. O PT é resultado desse processo. Nos apresentamos para a sociedade como o novo credenciado para dirigir um outro projeto de nação - longe dos vícios da política e dos políticos tradicionais. Socialistas sim, porém com clareza de que esta alternativa não é um projeto que se constrói por decreto, e muito menos sem democracia.

Qualquer projeto de sociedade só será bem-sucedido se for resultado da vontade do povo. Foram 27 anos de construção democrática de um projeto partidário, mais de duas décadas para convencer o povo brasileiro de que seríamos uma alternativa viável para alcançarmos as mudanças que o povo tanto sonhava. E o povo brasileiro, de forma democrática, nos deu a oportunidade que pedíamos.

No primeiro mandato, a preocupação central do governo petista foi a governabilidade - reconheço que a falta de uma correlação de forças mais favorável foi um elemento importante na definição do caminho a seguir, o que levou o gerverno a manter "quase" a mesma política econômica anterior, com um crescimento muito abaixo do necessário para o Brasil. No entanto, acertamos na política social, distribuindo renda com o bolsa família, democratizando a educação com o ProUni, o Funded e a construção de novos campus universitários e novas universidades, incentivando os médios e pequenos produtores na cidade e do campo, ou seja, o pouco que tínhamos de dinheiro para investir investimos para diminuir a pobreza e o povo soube reconhecer, tanto que reconduziu o Lula para governar o país.

O sentimento que eu tenho é que o povo - sabedor da realidade e consciente das limitações impostas pela realidade econômica herdada dos nossos antecessores - compreendeu que quatro anos era pouco para o Lula demonstrar sua capacidade de realizar as mudanças que propugnávamos ao longo da existência do PT.

Os desafios continuam, as mudanças são necessárias, nosso projeto vai além dos interesses indiduais. Sabemos que o segundo governo Lula é fundamental para darmos mais um passo na construção de uma nova sociedade, aquela que lá no início deste texto justificou a minha entrada e a de milhares de brasileiros na política. É para isso que existimos, e não para construir ou fortalecer a biografia de alguns.

Queremos sair do segundo governo Lula com o nosso projeto coletivo mais fortalecido e esperamos que todos, indistintamente, trabalhem pensando na coletividade e não para salvar a sua própria história.

Sugiro que esta linha de reflexão seja um dos elementos importantes nos debates preparatórios com vistas ao III Congresso Nacional do PT.

Como diz o ditado sertanejo: "pra quem lê um pingo é letra"

Nenhum comentário:

Postar um comentário